grulham, gargalham gárgulas talhadas
de guarda nas muralhas dos arquivos
ao pé dos tempos, monstros nados-vivos
cantarias de esgar também tombadas
na ordenação dos medos, dos enigmas
da memória mais funda que alimenta
a glória, a dor, as vozes, os estigmas,
a luz, a sombra, a indecifrada, lenta
caligrafia que regista a nossa
precária identidade, mas nós tanto
a debatemos que se ri na grossa
lavra da pedra a gárgula do canto
e as outras fazem coro, ou talvez chorem,
talvez vociferando alguma assuste
os que a olhá-las se demorem
e talvez custe olhá-las, talvez custe
pensar que somos hoje um vago cúmulo
desse registo lúgubre e contínuo
e ver as sentinelas que no túmulo
nos mascaram a história e o destino.
Vasco Graça Moura, in Variações metálicas. Ed: Armazém das Artes, s.l., s.d.
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